A Força de Produção convidou os veteranos atores José Pedro Gomes e José Raposo para, numa experiência que ambos já haviam mostrado vontade há algum tempo, se encontrarem em palco. Em cena no Teatro Villaret, Ñaque, mostra a vivência de uma companhia teatral itinerante do século XVII que com dois atores vai percorrendo o país, refletindo sobre o dia-a-dia dos homens que dão vida a várias personagens e que vão acabando por revelar ao longo da interpretação o seu percurso de vida profissional que se acaba por confundir com o campo pessoal.
Da autoria de José Sanchis Sinisterra e estreado em 1980, Ñaque chegou a Portugal em 2018, mostrando ser um texto intemporal. Além de mostrar dois atores que lutam pelo seu ganha pão através de uma acreditação sobre a sua função de se apresentarem perante um público que os espera no teatro, estes homens acabam por viver os altos e baixos que qualquer artista enfrenta na sua viagem de vida. Os objetivos e vontades que acabam por não conseguirem chegar a bom termo, a mudança para dar a volta a uma situação sem rumo e a crença que sempre se conseguirá fazer mais e melhor, lembrando um passado por vezes duro, de saltimbancos mas com a esperança sempre presente porque o sonho comanda a vida e o público pede sempre mais com a presença de cada artista a dar o melhor que sabe de si perante a exigência de um todo complexo.
A vida ingrata de um ator que sofre com os seus altos e baixos é retratada em Ñaque, onde dois excelentes atores contracenam como se tivessem numa amena cavaqueira pessoal e particular, num ambiente descontraído. O estatuto e profissionalismo de José Raposo e José Pedro Gomes já mostra ao público um à-vontade em palco único, fazendo mesmo com que o texto consiga ser valorizado pela forma como a naturalidade da dupla impera no espetáculo que é apresentado.
Num cenário simples onde somente uma árvore e umas escadas de metal existem, uma bicicleta e uma cavalo de balouço acabam por compor o quadro para que os atores circulem entre o pouco que existe e o quase nada, relatando o percurso enquanto dupla de entretenimento e o trajeto profissional de forma individual porque afinal antes de Ñaque já existe um passado de aprendizagem e comunhão com outros atores. Quando tudo começa, como tudo acontece, as quedas e lutas e o final de um ator, a despedida dos palcos e o fim de uma carreira que na maioria dos casos não deixa marca futura.
A história de Solano e Rios, os atores itinerantes que analisam as suas vidas sem esconderem que pela passagem na terra todos somos piolhos, que nascem, vivem e morrem, sem deixar saudade!
Onde estamos?
Num teatro…
A sério?
… ou algo parecido.
Outra vez?
Outra vez.
Isto é o palco?
Sim.
E aquilo é o público?
Sim.
Parece-te estranho?
Diferente.
Dois actores errantes, miseráveis, mas com uma esperança inimaginável na sua existência de criadores de sonhos por palavras. Acompanhamo-los ao longo da sua jornada, sorrimos com eles, choramos com eles, temos fome com eles, maravilhamo-nos com eles, impacientamo-nos com eles… e no final, percebemos, somos todos iguais. Somos seres humanos. Como eles…