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O Informador

Na conversa com... Nuno Nepomuceno

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Lançou a sua primeira obra em 2012 e desde então que quase se tornou tradição lançar uma nova história por cada ano. Agora, no início de 2021, O Cardeal está a chegar às estantes das livrarias nacionais e a vários lares para continuar o sucesso alcançado pelas anteriores obras de Nuno Nepomuceno, principalmente com a série Afonso Catalão onde chegou junto dos leitores com verdadeiros thrillers. A Célula Adormecida, Pecados Santos, A Última Ceia e A Morte do Papa são os grandes sucessos deste nosso autor português que tem crescido e dado o melhor das palavras a todos nós. Desde há muito que acompanho os seus lançamentos que sempre me têm conquistado, O Cardeal não será certamente uma excepção, no entanto agora quero mesmo é que desse lado possam conhecer um pouco melhor o Nuno que da curiosidade conquistou o sonho e cada vez mais um lugar de destaque na literatura portuguesa. 

 

Para quem não conhece o percurso de Nuno Nepomuceno, o que pode saber sobre a tua caminhada até chegares aos tops literários nacionais?

Chamo-me Nuno, tenho 42 anos e publiquei o meu primeiro livro em 2012, ano em que venci o Prémio Literário organizado pelo grupo Sonae, o grupo LeYa e a revista Lux Woman, com O Espião Português. Seguiram-se os restantes volumes da trilogia Freelancer e os cinco da série que desenvolvo atualmente, dedicada ao professor Afonso Catalão. Sou um escritor de thrillers, sendo ainda autor de vários contos e de duas séries de ficção em podcast. Considero que o sucesso comercial que os livros têm tido se baseia essencialmente na continuidade e não depende de um título em particular.

 

Leitor desde cedo, por influência familiar, quando percebeste que a criação e desenvolvimento de histórias viria a marcar presença na tua vida?

Foi por volta do fim da adolescência, numa idade que não sei dizer ao certo qual terá sido. Li imenso durante essa fase e houve um momento em que comecei a sentir curiosidade sobre como seria ter a oportunidade de estar do outro lado, isto é, poder criar a história e como tal chegar às pessoas, despertando nelas sensações, emoções e imagens.

 

Neste momento mais virado para o lançamento do teu mais recente thriller, O Cardeal, o quinto volume da série Afonso Catalão, fala-me um pouco sobre esta obra?

De uma forma muito simples, O Cardeal é uma história de crimes, que acontecem entre a pacata cidade universitária de Cambridge e a Cidade do Vaticano. Centra-se na família Emanuel, que os leitores da série já conhecem de A Morte do Papa e aborda vários temas, entre os quais a forma como a sociedade contemporânea se centra demasiado na imagem e nas aparências. Sobretudo, na forma como estas podem iludir.

 

O que trás O Cardeal para valorizar e levar os leitores que não conhecem esta série a voltar atrás e a quererem ler “A Célula Adormecida”, “Pecados Santos”, “A Última Ceia” e “A Morte do Papa”, para conhecerem tudo o que levou Afonso Catalão ao momento atual?

A minha opinião está naturalmente condicionada, mas considero que O Cardeal é o livro mais coeso e maduro de toda a série. Penso nele como um thriller sobre e para pessoas que gostam de livros. Julgo que qualquer leitor irá relacionar-se facilmente com as personagens, uma vez que têm mais do que uma dimensão. Por outro lado, o facto de fazer regressar Afonso à cidade de Cambridge, e as referências aos volumes anteriores que contém, irão certamente despertar muita curiosidade. De uma certa forma, O Cardeal é uma homenagem a toda a série, recuperando arcos e personagens que tinham ficado para trás.

 

A série Afonso Catalão, após cinco volumes tem ainda pernas para andar por mais uns anos seguindo e fazendo o agrado dos leitores que têm apoiado estas personagens e narrativas?

Espero que sim! É natural que tanto a série, como eu, comecemos a acusar algum desgaste, mas há registo de várias sagas literárias com uma longevidade maior, que continuam a ter sucesso. Não sei se irei querer prolonga-la muito mais. Receio que os leitores se cansem de mim, além de que a continuidade da série poderá ser redutora da minha carreira, impedindo-me de escrever novos livros com outras personagens ou noutros registos. Mas, pelo menos, durante mais um livro, Afonso Catalão estará de volta.

 

Cada personagem criada tem algo de real de pessoas que conheces ou tentas assim aproveitar o melhor ou o pior de cada um ou a criação destas pessoas surgem como idealizações sem semelhanças com realidades próximas?

As personagens são todas ficcionadas. Por exemplo, em A Última Ceia, em que utilizei diversos assaltos reais para criar o enredo, cheguei a ir buscar histórias e características de pessoas que conheci durante a pesquisa. Em O Cardeal isso não aconteceu. Os crimes reais que serviram de base aos arcos narrativos do livro foram adulterados, de modo a proteger a identidade das famílias das vítimas.

 

Como surgem os primeiros sinais para a criação de uma nova história? Procuras a verdade, por lançares histórias inspiradas em factos reais, conheces os locais, entrevistas protagonistas e conhecedores? Como tudo começa e continua a partir do momento em que as primeiras ideias surgem até iniciares o processo de escrita?

É difícil explicar, uma vez que já aconteceu de modos diferentes. Nos primeiros livros que escrevi, a inspiração vinha frequentemente sob a forma de imagens. Via algo na minha cabeça, que depois desenvolvia de modo a criar um enredo condizente. A série Afonso Catalão tem sido construída de outro modo. Começo por uma ideia, algo que cresce devagarinho e que só depois de algum tempo de reflexão é que começa a ganhar contornos definidos. Diria quase que neste momento trabalho através de camadas, de pequenas ideias que se vão sobrepondo, acrescentando algo à história e às personagens. E de repente, começo a redação do livro. Não me preocupo muito com o miolo da história, mas sobretudo se me sinto seguro face ao início e fim do livro. O que virá no meio dependerá em grande parte da inspiração que surgir. Com o passar do tempo aprendi que as minhas melhores ideias surgiram em momentos de escrita livre.

 

Ao longo da escrita deixas que as personagens cresçam por si ou acabem por perder espaço consoante as ideias que vão surgindo e sendo alteradas com o desenrolar da ação ou tens um processo criativo rígido do início ao fim com o principio, meio e fim bem definidos sem possíveis oscilações?

Depende da personagem e do papel que lhe destino na história. Os protagonistas, como são o caso de Afonso Catalão, Adam e Lizzie Emanuel em O Cardeal, normalmente não conseguem fazer de mim o que querem. Relativamente a outras personagens, por vezes, o caso muda de figura. Um exemplo: o camerlengo Horace Tremblay de A Morte do Papa. É introduzido no livro como uma figura secundária e gradualmente ganha espaço, terminando-o como o elemento mais importante para toda a intriga. Isto não foi planeado; somente algo que aconteceu assim. Não consigo explicar porquê. Considero tratar-se de uma questão de sensibilidade. Simplesmente sentimos que temos de deixar a personagem crescer.

 

Escrita terminada para ser revista pelo autor, costumas alterar o sentido de algumas situações para dar um maior sentido ao desenlace e após a leitura de editores e conselheiros literários?

Sim, os livros sofrem várias alterações durante o processo de edição e revisão. Por vezes, trata-se de questões gramaticais e de semântica; noutras, podem ser parágrafos ou ideias que, apesar de para mim, que escrevi o livro, fazerem sentido, podem não o fazer do ponto de vista do leitor; ou, então, de simples melhorias, como aconteceu em O Cardeal. Alterei o penúltimo capítulo do livro durante a revisão, porque quis torná-lo mais claro e dramático. No geral, trata-se de um processo muito trabalhoso, mas igualmente reconfortante, uma vez que, se estivermos rodeados das pessoas certas, o livro poderá beneficiar imenso.

 

As tuas obras têm andado muito em torno do thriller. É neste estilo que sempre te sentes bem ou pensas um dia criar um romance ou outro género literário para chamares outros leitores para a tua obra?

Gostaria de experimentar outro género, que, neste momento, prefiro deixar em privado. No entanto, não será para já. No futuro mais próximo irei continuar a escrever thrillers.

 

Gostarias de ver as tuas obras a passarem para a grande tela cinematográfica ou para um formato série?

Sim, eu sou consumidor de ficção televisiva e cinematográfica, pelo que seria agradável ver as minhas personagens com um rosto, encarnadas por pessoas reais. É algo que gostaria que viesse a acontecer, mas que infelizmente não ainda se concretizou.

 

Focado muito na religião, a série Afonso Catalão tem conquistado os tops nacionais. Sempre foi este o caminho que quiseste seguir dentro da literatura ou percebeste que é na espionagem religiosa que os leitores mais te acarinham?

A ideia que originou A Célula Adormecida não se focava tanto na religião muçulmana como acabou por acontecer. O tema principal do livro deveriam ter sido as tensões sociais. No entanto, no decurso da pesquisa, acabei por começar a desenvolver um interesse sobre religião em geral, que se repercutiu no enredo e livros subsequentes. Portanto, o foco religioso acabou por ser quase acidental. No entanto, dado o passado de Afonso Catalão, neste momento é algo que faz parte da série. É difícil evitá-lo, porque é algo que o define como pessoa.

 

Quando terminas a escrita de um novo livro e o vês publicado logo começas a elaborar as ideias sobre o que vem a seguir?

Não. Normalmente, preciso de me afastar um pouco. O processo de revisão e promoção inicial ao livro costuma ser bastante intenso. Só quando finda é que começo a pensar mais a sério no livro seguinte.

 

Se pudesses alterar partes de algum dos teus livros, fazias-o a pensar na continuação da história, por exemplo, na sequência da série Afonso Catalão, ou mantinhas tudo como foi criado?

Há sempre aspetos que podem ser melhorados. Nenhum livro é perfeito e se tivesse a oportunidade de alterar os livros já publicados, iria fazê-lo. Mas na altura em que os estamos a escrever somos obrigados a fazer escolhas e devemos assumi-las.

 

Alcançar os tops nacionais de vendas deve ser o objetivo de qualquer autor que gosta de sentir o carinho dos leitores. Como reagiste quando começaste a ver as tuas obras a serem vendidas e a suscitar um maior interesse também pela crítica?

Não é meu objetivo vender milhares de livros, ou ser o autor mais vendido do meu país. Não escondo que fico contente quando vejo um dos meus livros num top de vendas, ou leio algo agradável escrito a seu respeito, pois é um sinal de reconhecimento, mas a minha preocupação principal é a qualidade da obra em si. Nesse aspeto, sou algo obsessivo. Preocupo-me imenso com a possibilidade de desiludir os leitores. Infelizmente, muitas pessoas têm hoje em dia de fazer um esforço grande para comprar um livro e não quero que os que o fizerem se sintam defraudadas.

 

Como lidas com o sucesso e com a proximidade com os leitores que te têm seguido ao longo do tempo?

Considero que tenho uma boa relação com os meus leitores. As pessoas tratam-me normalmente com respeito e mostram-se compreensivas em relação ao facto de eu ser reservado. Talvez gostassem que eu me desse a conhecer mais, mas na realidade, a maioria conhece-me por causa dos livros e acho que aceitam bem a minha forma de ser.

 

Como leitor que estilos aprecias?

Leio sobretudo thrillers e romances históricos. Ocasionalmente, também leio fantasia e um ou outro romance contemporâneo.

 

Autores e livros dentro do thriller que aconselhas a quem aprecia as tuas obras?

Considero que Ken Follet será sempre uma aposta segura, quer nos thrillers com os quais começou a carreira, como com os romances históricos que escreve atualmente, incluindo Os Pilares da Terra, que é o meu livro preferido. Depois, há outros autores dos quais gosto bastante, nomeadamente, Nicci French, Gillian Flynn e Daniel Siva.

 

Metas e objetivos enquanto autor em Portugal e internacionalmente?

De momento, apenas desejo longevidade para a série Afonso Catalão. O que seja que vier a seguir, será bem-vindo.

 

No futuro o que podemos esperar nas criações de Nuno Nepomuceno?

Para já, mais um volume da série Afonso Catalão, que espero ter pronto no início de 2022. Pelo caminho, eu e a Cultura Editora ainda iremos reeditar a trilogia Freelancer e produzir mais uma temporada da série de ficção em podcast O Assassino. Depois de 2022, planeio uma pausa na minha carreira por tempo indeterminado, mas com a intenção de regressar.

 

Um convite a novos e antigos leitores dos teus thrillers para conhecerem não só O Cardeal como tudo o que está para trás…

É essencialmente um convite à leitura, seja O Cardeal, outro dos meus livros, ou qualquer um, escrito por outra pessoa. Não há maior evasão do que um livro, deixarmo-nos perder numa história e na vida de uma personagem. De uma forma simples, deixem-se sonhar.

 

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