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O Informador

Hoje Estarás Comigo no Paraíso [Bruno Vieira Amaral]

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Autor: Bruno Vieira Amaral

Editora: Quetzal

Lançamento: Abril de 2017

Edição: 1ª Edição

Páginas: 368

ISBN: 978-989-722-358-7

Classificação: 4 em 5

 

Sinopse: Em Hoje Estarás Comigo no Paraíso, Bruno Vieira Amaral, desenha uma investigação do assassínio do primo João Jorge - morto no bairro em que ambos viviam no início dos anos 80 - e usa essa investigação como estratégia de recuperação e construção da sua própria memória: a infância, a família, o bairro e as suas personagens, Angola antes da Independência e nos anos que se lhe seguiram, e a figura (ausente) do pai.

Na reconstituição da personalidade e do percurso da vítima, da noite em que tudo aconteceu, na apropriação que o narrador faz de uma ligação com João Jorge (mais ou menos forjada pelos mecanismo da memória) - e de que faz parte essa busca mais ampla das dobras do tempo e do esquecimento - são utilizados os mais diversos materiais: arquivos da imprensa da época, arquivos judiciais, testemunhos de amigos e familiares, e a literatura, propriamente dita - como uma possibilidade de verdade, sempre.

 

Opinião: Um acontecimento familiar no passado marca toda a narrativa que Bruno Vieira Amaral criou em Hoje Estarás Comigo no Paraíso. Com uma narrativa de excelência e com uma ótima qualidade a autobiografia une-se com a perceção dos factos sobre um crime que aconteceu há alguns anos atrás sobre um familiar, o primo João Jorge, que outrora lhe tinha sido próximo. 

Recorrendo a uma demonstração real e verdadeira dos factos, sem omissões, e com um poder de criação e descrição espacial muito boas, o realismo que é impresso nas palavras conquista o leitor que desde logo fica interessado em cada pormenor sobre a verdade dos acontecimentos, os locais e as pessoas que estão por detrás de um passado violento entre vidas que se foram cruzando num bairro onde as diferentes culturas conviviam para sobreviver. 

Tudo começa com a investigação pessoal em torno do assassínio de João Jorge, o primo. A partir do momento em que o passado começa a ser remexido, as memórias de infância e adolescência surgem provando que no presente convivemos com o que fomos anteriormente, onde os primeiros anos de vida contam e marcam de certa forma o futuro. Com uma mãe lutadora, um pai ausente que se julgou morto e num bairro pobre onde cresceu e foi aprendendo pelas ruas como é sobreviver em sociedade, Bruno Vieira Amaral não ousa sequer esconder o que foi sentindo enquanto percorre ruas, casas e estabelecimentos em busca de pessoas, documentos e causas sobre o que se terá passando na verdade sobre a morte de João Jorge. Fazendo uma descrição exemplar sobre os anos em que conviveu com a realidade onde João Jorge foi morto, tudo é recordado na primeira pessoa, desde a piscina improvisada pela Junta de Freguesia, aos atributos físicos de certas mulheres do bairro, às conversas de café, os almoços de Domingo, as alcunhas e o dia-a-dia que era vivido entre a comunidade. 

Fazendo um bom enquadramento histórico e temporal com a realidade de Portugal e de Angola a ser debatida, explicando assim a personalidade de algumas das personagens, recorrendo também à literatura e imprensa da época para relatar o crime do primo, Bruno Vieira Amaral não deixa nenhum recurso de lado, fazendo uso da cultura e dos acontecimentos reais para dar uma maior verosimilhança à sua obra. Hoje Estarás Comigo no Paraíso é um bom livro, de escrita limpa, sincera e elaborada de forma a tocar nos assuntos necessários sem cansar.

Já havia lido comentários acerca da primeira obra de Bruno Vieira Amaral, As Primeiras Coisas, e também alguns artigos de opinião próprios pela imprensa nacional, mas é a primeira vez que tenho contacto com uma narrativa da sua autoria e deixem-me que vos diga que temos autor com um estilo bem próprio e eficaz com a sua noção de transparência, assim não se estrague e invente fugir do que está feito para enveredar por outros caminhos literários.

 

Livro cedido pela editora Quetzal.